"Nada vai acontecer se o Rio não fizer a reforma da previdência", diz economista-chefe da Fecomércio

Nova edição do “Rio em Números”, publicada pelo Instituto Fecomércio de Pesquisas e Análises (IFec), chama atenção sobre a necessidade de o Estado concluir a sua reforma da previdência para retomar o controle da despesa pública e criar condições de aproveitar a tendência de incremento das receitas ligadas ao petróleo. Em entrevista ao Fórum de Desenvolvimento do Rio, o economista-chefe da Fecomércio, João Gomes, responsável pela publicação, destacou o esforço do Executivo estadual na recuperação da economia, mas apontou o patamar das despesas com pessoal como um desafio a ser enfrentado para alcançar o equilíbrio das contas públicas. O levantamento alerta também que se o Rio de Janeiro perder a Ação Direta de Inconstitucionalidade sobre a divisão dos royalties do petróleo, que tramita no Supremo Tribunal Federal, o Estado deixará de arrecadar aproximadamente R$ 6 bilhões já no primeiro ano da mudança. A publicação será entregue aos deputados nesta terça-feira (17/12). 

1. Quais são os principais pontos abordados por esta segunda edição do Rio em números?

Essa segunda edição é focada na parte fiscal do Estado do Rio de Janeiro. O levantamento identificou três questões principais que devem ser abordadas para que o Rio de Janeiro retome de vez a trajetória de crescimento: (a manutenção) do Regime de Recuperação Fiscal, (o crescimento das) receitas com royalties e a reforma da previdência. O grande ponto fiscal que temos agora é a reforma da previdência. A evolução da despesa com pessoal é preocupante. Nós levantamos, com base em dados da Secretaria de Fazenda, que, em 2018, mais de 67% de toda despesa de pessoal foi para pagar servidores públicos ativos e inativos. Além disso, mais da metade desse gasto, que chegou a 42 bilhões, foi para pagar os aposentados. Existe um dever de casa pra ser feito. É uma questão demográfica.

2. Rio de Janeiro terminou o ano de 2018 com a dívida consolidada líquida acima do permitido por lei. Qual a tendência observada para o fim deste ano e 2020?

Temos uma perspectiva de investimento nos próximos anos que é favorável. O Rio de Janeiro vem trilhando um caminho positivo a partir, sobretudo do segundo semestre de 2019. A tendência pelo lado da receita é positiva e é possível que se faça exercícios específicos pelo lado da despesa para ajudar na velocidade da retomada. Nos próximos três anos, conforme os investimentos forem maturando, se acontecer a reforma da previdência nos estados, isso deve acelerar ainda mais.

3. Quais serão os fatores que vão alavancar a economia do Rio nos próximos anos?

Temos ainda alguns gargalos em termos de burocracia, maior simplificação é necessária.Mas, no ambiente em que estamos vivendo hoje, as reformas microeconômicas que foram realizadas, como a reforma trabalhista, devem elevar a produtividade, melhorar o ambiente de negócios, atrair investimentos e o ciclo começará a se tornar virtuoso.

4. Se o Regime de Recuperação Fiscal (RRF) não for renovado em 2020, o Estado precisará de R$ 7 bilhões somente para arcar com os juros da dívida pública. O Estado tem condições de arcar com essas obrigações financeiras? O seu levantamento detectou riscos para o Estado?

O estoque de dívidas é muito elevado com várias taxas de juros diferentes incidindo sobre o montante. Por isso, a não Renovação do Regime de Recuperação Fiscal seria muito ruim para o Rio de Janeiro. O estado ainda está num processo de recuperação econômica, ainda está num processo de adequação fiscal, principalmente pela perspectiva de realizar a reforma da previdência. Qualquer coisa que tire o foco dessa trajetória, vai aumentar a necessidade de desembolso de recursos e dificultar o caminho da recuperação. Este ano foi positivo porque foi possível organizar as finanças do estado. Não é por acaso que o estado está conseguindo recuperar sua economia.


5. Em abril de 2020, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgará a constitucionalidade da Lei 12.734 de 2012, que alterou critérios para a distribuição de royalties e receitas obtidas pela exploração do petróleo entre União, estados e municípios. Se perder a ação, o governo estadual perderá, em conjunto com os municípios, cerca de R$ 56 bilhões nos próximos 4 anos. Que impacto a mudança trará ao estado?

Tivemos quatro anos de crise profunda. Haverá nichos que não se recuperarão mais, empresas que não conseguirão voltar. Saindo dessa crise, se perdermos a arrecadação com os royalties nesse momento, em que esse é um dos fatores que ajuda na recuperação, vai ser muito complicado. Se esses dispositivos forem declarados constitucionais teremos uma déficit primário de R$ 6 bilhões em um ano, tomando como base a arrecadação de 2018,segundo nosso levantamento. Seria uma alteração totalmente incoerente com o que se propôs em 2017 , quando se organizou uma forma para que o estado do Rio de Janeiro pudesse sair da crise. Seria incoerente tanto a não renovação do Regime de Recuperação Fiscal, quanto “tungar” do Rio de Janeiro qualquer valor referente às receitas dos royalties.


6. Como readequar as contas públicas sem que as políticas de austeridade atinjam serviços essenciais ?

Quando nós temos responsabilidade fiscal, criamos um ambiente favorável e atraímos investimentos. Mas nada vai acontecer sem a reforma da previdência estadual. Temos uma proporção muito grande dos nossos gastos com inativos. Nós não estamos retirando, arrochando, deixando de gastar. Devemos fazer as reformas para liberar recursos. Para poder gastar de forma sustentada, precisamos ter disciplina fiscal. Você não pode gastar mais do que arrecada. Nosso levantamento mostra claramente que os estados que apresentam a maior proporção de aposentadorias de servidores com idade média de 55 anos são os que apresentam os piores resultados previdenciários. É uma questão demográfica.O Brasil não pode cometer o erro histórico de se tornar um país velho, sem enriquecer antes. Essa janela demográfica é muito importante para investimentos em educação e tecnologia para termos um ganho de produtividade. O país já está fazendo esse dever de casa com a reforma da previdência nacional. A conta hoje no Rio de Janeiro ainda não fecha e como nós mostramos
no “Rio em Números”, se não agirmos, o déficit tende a aumentar.