Lixo é matéria-prima fora do lugar

Na indústria de hoje tudo pode e deve ser reaproveitado. Somente no Brasil calcula-se que anualmente são “jogados fora” cerca de R$ 10 bilhões em materiais que poderiam ser destinados corretamente e ganhar novas funções. O Rio em Foco que vai ao ar nesta segunda-feira (23/09), às 22h na TV Alerj, (Canal 12 da Net/Claro) recebe o professor e consultor do Banco Mundial e da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Fabrício Soler, e a assessora sênior de projetos e processos do Conselho Empresarial Brasileiro para o Desenvolvimento Sustentável (CEBDS), Tatiana Araújo,  para uma conversa sobre os desafios na destinação correta dos resíduos, e a importância de uma gestão moderna e sustentável dos resíduos sólidos.

O Brasil é o quarto país que mais produz lixo no mundo. No entanto, sua relação com a destinação final dos resíduos é um assunto muito mal resolvido. Segundo o presidente da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), Carlos Silva Filho, países que estão na mesma faixa de renda per capta do Brasil, que seria de média e baixa renda, possuem, em média, uma cobertura de coleta em torno de 90%, uma destinação adequada superior a 90% e um índice de reciclagem de 27%. Fazendo uma comparação destes dados com a última edição do Panorama da Abrelpe, constata-se que o Brasil está bastante alinhado em relação a cobertura de coleta regular (em torno de 91%), atrasado na destinação final que fica em torno de 56% e bastante defasado na reciclagem que não passa de 4%. “Isso mostra que precisamos de medidas atenuantes e avançar, principalmente na remuneração adequada desses serviços, para chegar no mínimo ao mesmo nível de desenvolvimento dos países que estão na mesma situação que o Brasil”, afirma o presidente da Abrelpe: “e depois, avançarmos para indicadores e práticas modernas como as que percebemos que já estão implementadas em países mais desenvolvidos”.

“É um desafio hercúleo”, pondera Fabrício Soler. Para o consultor do Banco Mundial, em virtude do alto índice de coleta, as pessoas têm a impressão que as cidades são limpas, e falta uma maior visibilidade em relação à destinação dos resíduos. Hoje, aproximadamente 55% do que é gerado tem uma destinação correta, ou seja, vai para os aterros sanitários. O problema são os outros 45% que continuam sendo despejados em lixões. “Uma das medidas que se discute no Brasil esbarra num tema delicado: a sustentação financeira de uma empresa ou serviço de limpeza e manejo de resíduos sólidos. Em resumo: estamos falando de uma nova taxa ou tarifa. Está o cidadão preparado para esse novo desafio?”

“A grande maioria dos municípios cobram essa tarifa no âmbito do IPTU. Então o cidadão não tem uma correlação direta daquele serviço com o pagamento”, diz Fabrício. Segundo ele, Santa Catarina é o estado brasileiro mais avançado em experiências sobre este tema. A cidade de Joinville, por exemplo, concedeu a uma empresa privada o serviço de coleta, tratamento e destinação final dos resíduos sólidos. “É uma cobrança direta pelo ente privado. O boleto, quem encaminha é a empresa e não o município. A gente entende essa modelagem como desejável, embora a cobrança da taxa possa gerar uma animosidade inicial com a sociedade”, diz.

Tatiana Araújo lembra que o tema já está colocado desde 2010, quando foi aprovada a Lei Nacional de Resíduos Sólidos e que ao longo desses nove anos as indústrias vêm se adaptando. “Temos tanto empresas que tentam fazer a parceria com cooperativas, quando não tem uma coleta adequada, como aquelas que fazem o próprio posto de coleta, como no caso bem conhecido das cápsulas da Nespresso”, conta.  Para a assessora do CEBDS, mais importante até do que conscientizar o grande público sobre a necessidade da destinação adequada, é chegar às empresas. “Elas já estão revisitando seu processo produtivo para verificar onde podem colocar melhorias para reduzir o uso de material que vai gerar resíduo no final, ou para retornar esse resíduo na produção reinserindo-o no processo. Então aí entra toda aquela conversa de economia circular”, diz Tatina.

O deputado Carlos Minc (PSB) lembra que para aprovar a Lei Nacional de Resíduos Sólidos em 2010, estabelecendo o sistema de logística reversa, foram fechados pactos setoriais com cinco grandes setores econômicos. “O principal deles de embalagens, que representa 60% dos resíduos sólidos”, diz Minc. Cinco anos depois, foi assinado o Pacto Nacional de Embalagens. “Nós demos um ano para as empresas se adaptarem e estabelecemos uma primeira meta modesta, que aumenta 10% a cada ano”, explica o deputado que à época ocupava o ministério do Meio Ambiente. “Agora vamos, na brevidade, fazer uma audiência do “Cumpra-se” para ver como isso está funcionando. Para cada circuito dessas embalagens: vidro, lata, papelão, plástico, tem que ter redes coletoras. O que significa apoiar prefeituras, apoiar os catadores. Porque no fundo, lixo é matéria-prima fora do lugar. Tudo pode e deve ser reaproveitado. É esse o objetivo da lei da Logística Reversa, agora chamada, Economia Circular”, diz.

A partir dessa terça-feira (24/09), o programa estará disponível no canal do Fórum de Desenvolvimento do Rio no YouTube. Na TV Alerj, as reprises serão exibidas no sábado (28/09), às 17h, e domingo (29/09), às 20h.