Política de inclusão no trabalho para deficientes ainda é paternalista

“O emprego ainda é o principal desafio para as pessoas com deficiência. Mesmo com os avanços dos últimos anos, a taxa de desemprego para pessoas com deficiência ainda é duas vezes maior".  Assim Judith Heumann, assessora especial dos Direitos de Pessoas com Deficiência do governo americano e uma das mais proeminentes ativistas na área abriu sua fala no debate organizado pela Câmara Americana do Comércio (Amcham Rio), nno último dia 14/08, que abordou a dificuldade para inclusão no mercado de trabalho de pessoas com deficiência. A ativista veio ao Brasil para conhecer projetos de acessibilidade em comunidades carentes.

Segundo Heumann, sua trajetória na luta pelos direitos das pessoas com deficiência começou há 40 anos, quando mesmo cumprindo todos os requisitos necessários para preencher uma vaga de professora em uma escola municipal, sua candidatura foi recusada por ser tetraplégica. "Fui considerada incapaz", conta ela, que moveu um processo contra a secretaria municipal de educação. A plateia, a ativista relatou com orgulho sua participação na maior vitória já conseguida até agora nos Estados Unidos: a aprovação da lei americana para pessoas com deficiências, em 1990, que tornou crime a descriminação de pessoas por qualquer tipo de deficiência. "O Brasil aprovou recentemente o Estatuto da Pessoa com Deficiência, mas é necessário trabalhar a conscientização: As empresas ainda não estão preparadas para lidar com pessoas com deficiência. Ainda há o pensamento de que é preciso achar a pessoa com a deficiência certa para o emprego certo, o que é preconceituoso já que não leva em consideração a real aptidão e preparo da pessoa”, explica.

O superintendente de Políticas para Pessoa com Deficiência da Secretaria Estadual de Assistência Social, Marcos Antônio Castilho, concordou:“Não adianta nossa lei de que as empresas com mais de cem funcionários terem de 2% até 5% de funcionários com deficiência, se não há a conscientização. O que acaba acontecendo é que estas empresas contratam apenas para cumprir a cota e o funcionário acaba isolado dentro da empresa ou contratam pessoas com um currículo muito melhor do que a vaga oferecida porque são deficientes.”

Para combater essa prática, Heumann defende a parceria entre universidades e empresas: “Nos Estados Unidos as empresas financiam universidades que se adequem as necessidades dos deficientes”. Castilho destacou os esforços do governo para mudança deste cenário: “Avançamos muito na questão da acessibilidade nas escolas e universidades, mas o corpo docente precisa ser mais bem preparado e as pessoas com deficiência tratadas de acordo com seu tempo/dificuldade. O que impede a pessoa com deficiência de viver normalmente muitas vezes não é sua deficiência, mas as barreiras sociais”.

Outro fator que dificulta o acesso ao mercado para pessoas com deficiência é o paternalismo, segundo Heumann. “As empresas precisam entender que a pessoa com deficiência não precisa de excesso de protecionismo como metas menores, ser menos cobrado ou não trabalhar 8 horas por dia. Com isso a pessoa nunca vai se sentir incluída de fato na empresa”. Para não cair nessa armadilha, a gerente de Recursos Humanos da Ernst & Young afirmou que trabalha na empresa para encontrar o perfil certo para a vaga certa. "A partir do momento em que a pessoa com deficiência passa por este processo, ela vai render tanto quanto seus colegas, com os mesmos deveres e obrigações”

O debate também contou com a participação de  Augusto Fernandes, coordenador de Acessibilidade do Comitê Rio 2016, que falou sobre o papel do comitê na preparação para receber pessoas com deficiências durante os jogos. “As pessoas com necessidades especiais que vierem ao Rio precisam ter o mesmo direito de ir e vir que todos os outros turistas. Para isso, estamos capacitando os profissionais para lidarem com todo tipo de deficiência e nos certificando que todos os pontos turísticos do Rio estejam adequados", disse, afirmando que não acredita que as metas sejam todas atingidas. Augusto foi atleta de Judô de 1979 a 1992, ano em que sofreu um grave acidente durante um treino e ficou paraplégico. Segundo ele, atletas paralímpicos são um excelente exemplo de que a capacidade não está atrelada a deficiência: "Muitos bons atletas do tênis paralímpico não possuem os dois braços, mas se adequam, treinam e com o talento conseguem competir em um nível muito bom".

(Texto de Vinícius Pereira)