No início da utilização dos computadores em universidades e grandes corporações nas décadas de 50 e 60, os softwares eram um complemento do hardware, fornecidos pelos fabricantes de computadores sem custo algum para essas organizações. Com o surgimento da microinformática em meados de 70, consolidou-se a venda de licenças de software, prática que serviu de base para o crescimento da emergente indústria de software. Já nesta época, era comum a prática de pequenos usuários trocarem software sem pagarem por suas licenças.
Agora, os microcomputadores estão cada vez mais baratos e poderosos, os dispositivos móveis estão definitivamente em nosso cotidiano e cada vez mais dependemos dos softwares, desde pequenos aplicativos para tablets e smartphones, como aplicativos, editores de textos e planilhas eletrônicas, aplicativos de entretenimento, até grandes aplicações empresariais como sistemas ERP.
Muita coisa mudou desde o surgimento dos primeiros softwares licenciados, mas ainda é comum a prática do compartilhamento e aquisição de software sem o devido pagamento das licenças, comportamento mais conhecido como "pirataria de software". Esta realidade é ainda mais forte no Brasil. Segundo a Business Software Alliance (BSA), o Brasil amargou no primeiro semestre de 2011 o 5o lugar no ranking global de pirataria de software on-line. Isso pode não parecer muito importante para quem está utilizando o produto de forma ilegal, mas essa pirataria ocasionou no Brasil um prejuízo estimado de 2,62 bilhões de dólares.
É interessante notar que muitos dos que contribuem para este índice não estão necessariamente conscientes de seus atos. Outro estudo da BSA, em conjunto com a Ipsos, em 2011, revelou que 65% dos entrevistados acreditavam que instalar software em outros computadores de casa não era uma prática ilegal e 53% tinham a mesma opinião para softwares emprestados por amigos ou colegas de trabalho.
Por trás destes números, o que se percebe é que existe uma prática enraizada entre os usuários de se fazer múltiplas cópias a partir de uma licença original. É comum em muitas empresas que sejam adquiridas algumas licenças originais e a partir destas sejam feitas várias cópias para as máquinas que não possuem licenças. São justamente as cópias múltiplas sem licenças que mais afetam a indústria de desenvolvimento de software.
Além disso, muitos usuários argumentam que os produtos originais são caros, que os valores cobrados não são justos, que a empresa não precisa do dinheiro advindo da venda de licenças ou até que o custo de produção e distribuição de software licenciado é baixo, visto que este está sendo somente copiado, e não desenvolvido do zero. O que estas pessoas não percebem é que as empresas de desenvolvimento de software, neste modelo de negócio (venda de licenças), desenvolvem, mantêm, inovam e disponibilizam novas versões de software lastreadas na comercialização de licenças e esta é a forma de elas sobreviverem e crescerem.
Talvez o que grande parte dos usuários não tenha noção é o real impacto que a aquisição de software legal teria para a indústria e para economia como um todo. Um estudo realizado em 2010 pelo IDC e pela BSA projetou o impacto da diminuição da pirataria em 42 países, entre eles o Brasil. Segundo este estudo, a redução da aquisição de software ilegal no Brasil entre 2010 e 2014 em 10% poderia resultar em uma receita adicional de US$ 3,9 bilhões para as empresas. Isso equivale a uma arrecadação de US$ 888 milhões em impostos e, possivelmente, a geração de 12,3 mil novos postos de trabalho na área. Este mesmo estudo conclui que os ganhos poderiam ser ainda maiores, caso esta redução acontecesse em 2 anos ao invés de 4, com valores 34% maiores do que a projeção anterior.
Não é difícil imaginar que uma redução de 10% em 2 anos seja algo tão difícil. O Brasil reduziu sua pirataria de software 10 pontos percentuais em 5 anos e outros países, como a Rússia, conseguiram uma redução de 7% em apenas um ano (2007). O Brasil, mesmo que de forma lenta, está no caminho certo apresentando quedas consecutivas nos últimos 5 anos, ampliando gradativamente a importância da indústria de software na economia.
O que se espera nos próximos anos é que, com ações visando a conscientização dos usuários da importância da aquisição legal de software para a indústria e para o país como um todo, bem como aperfeiçoamento dos instrumentos legais e dos órgãos de controle, é que este panorama melhore ainda mais no futuro, tirando o Brasil da incomoda 5ª posição no ranking da pirataria e fazendo com que a indústria de software nacional alcance sua devida importância no cenário econômico nacional.
* Renato Luís de Souza Dutra é professor de Ciência da computação e Sistemas de informação da Universidade Anhembi Morumbi
Publicado em "Olhar Digital"