Heliana Marinho: Qualificação para profissionalizar o Carnaval

O Carnaval acabou, mas o trabalho nos barracões das escolas de samba continua. Com foco na cadeia produtiva do Carnaval, o Sebrae-RJ realizou uma pesquisa que apontou a insustentabilidade ambiental da festa. Este e outros pontos da produção do carnaval são abordados pela gerente de Economia Criativa do Sebrae-RJ, Heliana Marinho nesta entrevista.

O Carnaval acabou e os foliões há muito se retiraram das ruas e do Sambódromo. Contudo, o trabalho nos barracões das escolas de samba continua com o desmonte das alegorias e o planejamento para a festa do ano que vem. Com foco no cadeia produtiva do Carnaval, o Sebrae-RJ realizou uma pesquisa que apontou que a festa é insustentável na questão ambiental e deficitária do ponto de vista econômico. Nesta entrevista agerente de Economia Criativa do Sebrae-RJ, Heliana Marinho, explica estes dois pontos e fala sobre importância da qualificação da mão-de-obra e das escolas de samba.
 
Qual foi a motivação para a realização da pesquisa sobre a economia do carnaval?

É inegável que o Carnaval é uma festa robusta, de grandes proporções. A idéia foi observar o que acontece dentro dela a partir do ponto de vista econômico, focando nas micro e pequenas empresas que atuam nesse processo, tanto como prestadoras de serviço, como fornecedores.  O objetivo é tentar entender que rede é essa que atua no Carnaval e de que maneira ela se comporta para alcançar o resultado nos dias do desfile.
 
A pesquisa aponta o Carnaval como uma festa deficitária do ponto de vista econômico. A partir desta constatação, como a senhora avalia o investimento público feito neste evento?

Nós temos a tendência a olhar a linha direta do investimento, ou seja, o dinheiro sai dos cofres governamentais e vai para as instituições carnavalescas. No entanto, quando o poder público aporta o seu recurso na escola ou no produto Carnaval está investindo numa cadeia de atividades econômicas que giram   em torno disso. Está investindo em cultura, comércio, serviços, turismo e outros setores que a festa potencializa.
 
Como é possível aumentar a participação do capital privado na economia do Carnaval?

Para o Carnaval atrair o capital de outras entidades ou da própria iniciativa privada é preciso que os investidores tenham visibilidade do tipo de retorno que podem obter. A despeito disso, existem duas vias para o investimento empresarial. A primeira é a compra de espaços no Sambódromo pelos meios de comunicação e empresas detentoras de grandes marcas. A segunda forma pode se dar diretamente dentro das escolas. Isso significa que a escola precisa ser mais atraente aos entes privados e para tanto precisa investir mais em planejamento, na sua organização interna e no seu processo de logística.
A expectativa é que com a mudança da lei Rouanet e com a entrada das empresas diretamente no processo das escolas, as micro e pequenas empresas participem mais das agremiações do seu bairro. Portanto, acredito que há bastante espaço para o segmento privado dentro da cadeia produtiva do Carnaval.
 
Outro ponto questionado foi a sustentabilidade ambiental do Carnaval. A partir dessa informação, o Sebrae-RJ montou algum plano de ação junto às escolas de samba?

A proposta é alinhar o Carnaval a uma política de sustentabilidade ambiental e econômica, com a redução de resíduos gerados. Para isso é necessário qualificar as pessoas e prepará-las para um melhor desmonte e para que os resíduos desta fase sejam transformados em novos produtos. Nós vamos começar a fazer esta qualificação ainda este ano. De maneira geral, podemos considerar que com raras exceções apenas as escolas do grupo especial estão mais voltadas para isso. Elas procuram usar produtos reciclados ou que possam ser reutilizados. Portanto, nosso esforço está voltado para as escolas menores.
 
O Carnaval é marcado pelas relações informais de trabalho. Como a lei do empreendedor individual pode ajudar no processo de formalização?

A informalidade das relações de trabalho é impulsionada pela sazonalidade da ocupação. O Carnaval tem picos, apesar de ser um processo contínuo, e, portanto não requer o mesmo tipo de serviço e mão-de-obra por um período muito longo. As pessoas após concluírem seu trabalho nas escolas de samba, vão exercer seu ofício em outro lugar ou participam de outras atividades, mas isso não impede que eles tenham autonomia como empreendedores. A legislação do empreendedor individual é recente, começou sua implantação no ano passado e vem exatamente impactar de uma forma positiva todo esse processo. O fornecedor de serviços, por exemplo, uma bordadeira, pode usufruir dessa legislação e se formalizar sem necessariamente ser uma empresa e passar a ter todas as vantagens do ponto de vista previdenciário e trabalhista.
 
Quais são os esforços desenvolvidos pelo Sebrae-RJ para profissionalizar a mão-de-obra envolvida?

Jnto às escolas de samba do grupo especial nós realizamos cursos e oficinas especializadas. Há mais de cinco anos, o Sebrae-RJ tem uma parceria com a Associação de Mulheres Empreendedoras do Brasil (Amebras), que fica dentro da Cidade do Samba (no centro do Rio) e atua como o braço social da Liesa (Liga Independente das Escolas de Samba do Rio de Janeiro). A Amebras se estabelece como um local de qualificação, quase como uma grande incubadora para o Carnaval e ali, turmas são treinadas para atuar em todo este processo. No processo de qualificação entraram questões novas. Uma delas é dar um olhar diferenciado para as escolas que estão no grupo de acesso. As escolas que não participam do grupo especial são muitas. Só na cidade do Rio são 60. Em dezembro, fizemos uma oficina com 40 presidentes dessas escolas que vão fazer parte do processo de benchmarking para que um dia estejam no grupo especial. Nós entendemos que essas escolas são as que possuem mais necessidade no momento de qualificação da sua mão-de-obra. Além dessa qualificação técnica, vamos trabalhar a gestão das próprias escolas. Porque quando você consegue associar os processos de gestão com o processo de produção em si conseguimos ter um ciclo mais virtuoso e uma costura invisível ligando todas as fases da produção do Carnaval.