OsteRio: Novas instituições para uma nova realidade

11ª edição do evento mostra que megalópole brasileira já existe, mas precisa de novos arranjos institucionais que a representem e promovam seu desenvolvimento.

Rosa Lima

Vista assim do alto mais parece um céu no chão. Tal qual Mangueira, cantada por Paulinho da Viola, M'Bras, a megalópole brasileira é um contínuo de iluminação. Esse território unificado, que conurba as duas maiores cidades brasileiras e vai além, estendendo-se a Campos, no Rio de Janeiro, Campinas, em São Paulo, e chegando a Juiz de Fora, em Minas Gerais, já existe na prática como uma unidade econômica e social. Entretanto, ainda carece de instituições que a representem e promovam seu desenvolvimento. E, por conseguinte, o desenvolvimento do próprio país.

M'Bras: a megalópole brasileira foi tema do 11º OsteRio, a série de debates sobre o Rio de Janeiro realizados pelo Iets, com apoio da Light e da Osteria Dell'Angolo. O encontro reuniu, na noite de segunda-feira 20 de julho, três especialistas no assunto: o presidente da Associação Comercial do Rio de Janeiro, José Luiz Alquéres, que cunhou o termo; o pesquisador do Iets André Urani, e o presidente da Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano (Emplasa), Márcio Fortes.

Além de Wanda Engel, José Arnaldo Rossi, Amaury de Souza, Tito Ryff, Andrea Gouvêa Vieira, Amaury Temporal, Marcílio Marques Moreira, Rosiska Darcy de Oliveira, Thereza Lobo, Daltro Borges e Paulo Protásio, dentre muitos outros estudiosos e/ou entusiastas da ideia da megalópole como nova propulsora do desenvolvimento brasileiro, que lotaram o segundo andar na Osteria Dell'Angolo, em Ipanema.

A ideia é simples: se olharmos para o Rio de Janeiro e São Paulo com um olhar distanciado, veremos que seu território se expande para muito além dos limites traçados nos mapas expostos nas paredes dos prefeitos e governadores. A área engloba nada menos do que 232 municípios interligados por diferentes aspectos. Mas não conta com o amparo de políticas públicas inovadoras que trabalhem suas potencialidades de forma unificada.

Carência de representação

"Trata-se de uma unidade maior, da qual a maior parte das pessoas não se dá conta. Mas que é fundamental para se pensar os grandes problemas que se colocam para suas populações - problemas de saúde, transporte ou saneamento. A complexidade desses problemas, num mundo que se expande com o desenvolvimento de redes de comunicação, não se presta mais a soluções arcaicas e isoladas das câmaras municipais. O conceito de cidadania precisa ser trabalhado num nível mais amplo do que a mera divisão político-administrativa. O maior desafio da megalópole, que já existe na prática, é procurar sua representação", defendeu José Luiz Alquéres.

Nas palavras de André Urani, a área dessa megalópole equivale a menos de 1% do território brasileiro. Mas concentra 23% da população e 35 % do PIB brasileiros, com uma renda domiciliar per capita 55% superior à da média do país. Concentra ainda as principais instituições de ensino e pesquisa do Brasil, o maior número de bancos públicos e privados, o grosso da indústria de transformação, os principais portos e aeroportos do país, um rico mercado de serviços, além de uma quantidade expressiva de ativos culturais e naturais.

"São ativos extraordinários que podem ser trabalhados de forma estratégica em prol do desenvolvimento do Brasil", disse Urani, acrescentando: "Por isso M'Bras, como a batizou Alquéres, e não Riopaulo, seguindo a definição do canadense Richard Florida. Por que não é um movimento separatista. A ideia não é redefinir o pacto federativo nem mudar a constituição. Mas gerar um caldo de cultura que reúna empresas, governos e sociedade civil para criar instrumentos capazes de alavancar o desenvolvimento desse território. Vale a pena sonhar e imaginar que o Brasil pode entrar de cabeça erguida no mercado globalizado com instrumentos novos".

Uma nova institucionalidade

Chegando de São Paulo, onde está há cinco meses trabalhando no governo do estado, à frente da Emplasa (Empresa Paulista de Planejamento Metropolitano), o ex-deputado Márcio Fortes anunciou a formalização de um desses novos instrumentos: "Amanhã vou a Resende justamente para fazer a apresentação de um novo mapa que reúne 15 municípios lindeiros de três estados diferentes: Minas, Rio e São Paulo. Eles vão formar um consórcio, embrião de uma nova institucionalidade, que vai além da estrutura político-administrativa atual", disse.

Anunciou ainda o recente lançamento do Projeto de Lei que prevê a criação do Estatuto da Metrópole, para planejar o desenvolvimento dessas regiões, de autoria do deputado paulista Walter Feldman, que atualmente se encontra em tramitação na Câmara Federal e tem como relator o fluminense Indio da Costa. "Problemas como saneamento, assistência hospitalar e o trato com a questão ambiental fazem aflorar essa discussão. Com o estatuto, vamos estudar, por exemplo, quanto custa o município do Rio depositar seu lixo num aterro sanitário de Duque de Caxias ou internar no Souza Aguiar um doente de Nova Iguaçu".

Como passar do estatuto para a prática ou como formalizar esses novos arranjos em prol do bem estar comum é o grande desafio, mostrou o debate.

Iniciativas nesse sentido foram lembradas pelos presentes como a criação da Fundrem, voltada para o desenvolvimento da região metropolitana, do Codevap, centrado no Vale do Paraíba, ou mesmo o projeto Rio 2000, desenvolvido pelo urbanista Jaime Lerner. Experiências que se originaram de iniciativas governamentais e que terminaram todas esbarrando em entraves jurídicos e políticos.

A saída, o encontro sinalizou, passa primeiramente por uma mudança cultural, que pressupõe olhar para essa nova realidade com novos olhos. Passa também pela criação de novos arranjos institucionais, não-governamentais, como agências privadas de interesse público, criadas de baixo para cima, a partir da articulação das organizações da sociedade civil, independentes das verbas estatais.

"O caminho não é o redesenho federativo. Existem muitos exemplos mundiais a partir das crises vividas pelas metrópoles com a globalização. O movimento de reinvenção de cidades como Barcelona, Milão ou Nova York passou por entidades como as 'Port Authorities', mas por outras mais amplas também, e de geometrias variáveis, como as 'Partnerships for Development', ou outras ainda que são uma mistura de consórcios com parcerias público-privadas", afirmou Urani.

Fechando a noite, o presidente da Light, José Luiz Alquéres, sintetizou o espírito das novas institucionalidades capazes de responder aos novos desafios colocados pela atualidade: "Em artigo recente, o ministro Marcílio falou da nossa nostalgia do Marquês de Pombal, de alguém que chegue para botar ordem na casa e resolver os problemas. Eu proponho aqui uma receita antipombalina, que brote de baixo para cima, a partir da articulação das organizações da sociedade civil. O OsteRio é o melhor exemplo disso", finalizou.

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