Rio lança movimento para estruturar ecossistema de negócios de impacto no estado

O Rio de Janeiro apresenta diversas oportunidades para quem quer investir em negócios de impacto social e transformar realidades. Porém, os empreendedores que buscam solucionar problemas socioambientais ainda enfrentam gargalos no desenvolvimento do setor. A falta de clareza sobre o conceito de impacto social, o pouco acesso aos investimentos, a ausência de uma legislação específica, além do desconhecimento sobre as instituições de apoio são os principais entraves. Durante os dias 22 e 23 de agosto, os principais desafios dos empreendedores que aliam lucro a benefícios para a sociedade estiveram em pauta no Seminário de Negócios de Impacto – Incluir. Realizado pelo Sebrae, em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD), órgão da Organização das Nações Unidas (ONU), o encontro reuniu os principais atores do ecossistema nacional como aceleradoras de negócios de impacto, investidores, redes de negócios, agentes públicos e especialistas da academia. O foco do evento, que está em sua segunda edição, foi a região Sudeste, com um dia inteiro dedicado às questões locais e na promoção do empreendedorismo de impacto fluminense.

Durante o Seminário também foi lançada a logomarca do Rio de Impacto, criada em colaboração com a equipe de design da ESPM. O Rio de Impacto reúne 12 instituições de apoio aos negócios sociais no estado, entre as quais a Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro, por meio do Fórum de Desenvolvimento do Rio.

“Em 2016 o Sebrae-RJ percebeu que existiam muitas instituições de apoio aos negócios de impacto no estado, mas a gente não se falava. Então, convidamos um grupo para discutir os gargalos em comum e montamos um relatório para entender quem nós éramos e qual o estágio de negócio a gente atendia. Agora em 2017 nos consolidamos como um grupo que pensa e busca soluções para as questões dos empreendedores de negócios de impacto no Rio e para isso criamos um nome, Rio de Impacto, e também uma marca”, explicou Juliana Oliveira, analista do Sebrae-RJ. A primeira atuação conjunta do grupo foi a realização da “Pesquisa do Ecossistema de Negócios de Impacto Social do Rio de Janeiro” e o “Guia de Bolso Instituições de apoio a negócios sociais do Rio de Janeiro”, ambas disponíveis para download no site: www.negociosdeimpactosebrae.com.br

Para 2018 o Rio de Impacto deve trabalhar em cima do planejamento estratégico das ações do grupo, que ainda tem muitos desafios pela frente como estabelecer a governança e separar o que são bandeiras comuns a todos das instituições.“Esse processo de construção coletiva é trabalhoso. A participação da Alerj no grupo nos permite pensar que leis específicas podemos criar ou modificar no Rio de Janeiro, para alavancar o setor de impacto social no estado. Um exemplo é o Imposto Sobre Transmissão Causa Mortis e por Doação de Quaisquer Bens e Direitos que mistura no mesmo lugar transações sobre negócios sociais ou de impacto sem fins lucrativos e doações de herança. São dois casos muito diferentes. Você acaba na verdade penalizando as organizações sociais e os negócios de impacto ao instituir o imposto sobre a receita. Isso não existe em lugar nenhum do mundo e precisa ser separado. Tenho certeza de que deve existir um grupo ainda maior de leis que possam ser alteradas ou leis novas que possam ser pensadas para estabelecer um marco legal mais condizente para o Rio de Janeiro”, disse Leonardo Letelier, CEO da Sitawi Finanças do Bem, um dos palestrantes do evento.

“O que a gente gostaria de ver é uma espécie de “guerra fiscal” do bem. Os estados hoje se estapeiam para trazer grandes empreendimentos com a ideia de que vão trazer muitos empregos e arrecadação, mas na verdade abrem mão de impostos para viabilizar isso. Na verdade, você teria uma geração muito maior de empregos com a criação de diversas pequenas organizações. Então se o Rio de Janeiro se tornar um lugar propício para se iniciar ou crescer um negócio de impacto, acho que todo mundo ganha: o estado, a sociedade e os empreendimentos de impacto, completou Letelier.

Fazem parte do Rio de Impacto as seguintes instituições: Sebrae-RJ, NESst, Sitawi, Yunus Negócios Sociais, Universidade Santa Úrsula, Benfeitoria, ESPM, Instituto Gênesis (PUC-Rio), Sistema B, Alerj, Vox Capital e Shell Iniciativa Jovem

 

Painéis

O ecossistema das instituições de apoio fluminense, a importância da construção de indicadores de impacto e o papel da academia no desenvolvimento foram temas de painéis do evento. A subdiretora-geral do Fórum de Desenvolvimento do Rio, Geiza Rocha mediou a mesa que apresentou o perfil dos negócios sociais no Brasil e no estado. O Censo de Negócios de Impacto, desenvolvido pela Pipe Social, mapeou 579 empreendimentos no país, com 63% deles localizados no Sudeste, sendo 9% no Rio de Janeiro. Dentre as áreas de atuação destacam-se: educação (40%), tecnologias verdes (21%), Cidades (13%), cidadania e saúde (ambas com 10% cada) e finanças sociais (6%).

A pesquisa apontou também que as empresas do estado são mais maduras do que a média nacional, sendo 33% delas com menos de 3 anos de fundação, contra 40% no restante do país.

“No Rio de Janeiro, um em cada dois negócios já estão em fase de tração (19%). Surgiram vários empreendimentos no boom das Olimpíadas e vemos que eles conseguiram se fortalecer mesmo com a crise”, afirmou Lívia Hollerbach, cofundadora da Pipe Social, a primeira vitrine de negócios de impacto do Brasil.

Segundo dados apresentados, 25% das empresas de impacto fluminenses faturam até 100 mil reais, enquanto 15% já atingiram o patamar de 1001 a 500 mil e 14% de 501 a 1 milhão de reais. Já 14% delas afirmaram faturar de 1,1 milhão a 2 milhões e 4% acima desse valor. Porém, 33% alegaram ainda não terem faturado nada.

A pesquisa também apontou que permanece a desconexão entre o interesse do investidor e a necessidade de empreender, e que se não houver um aumento da oferta de investimentos nas etapas inicias da jornada das empresas, não haverá volume de negócios que possam dar escala em médio e longo prazo. O entendimento e a utilização de tecnologias inovadoras ainda se mostraram reduzidos em todo o país.

Estudos da Força Tarefa de Finanças Sociais e da Deloitte, também apresentados durante o evento, identificaram que em 2014, R$13 bilhões foram investidos por meio de mecanismos de Finanças Sociais (principalmente microcrédito) no Brasil e a expectativa é que, em 2020, esse número chegue a R$50 bilhões.

 

Papel da academia

Conhecer os modelos de legislação específicos para empreendimentos de impacto ao redor do mundo foi um dos objetivos do painel apresentado pela professora da Fundação Getúlio Vargas, Tânia Limeira. Na década de 1990, o governo britânico despertou para a importância das empresas sociais na solução de problemas sociais como desemprego, saúde e educacionais. Com o crescimento desses negócios, surgiu a necessidade de criar uma categoria na legislação para identificar essas empresas. Hoje elas são chamadas de Companhias de Interesse Comunitário (CIC). São empresas limitadas, cujos superávits financeiros são prioritariamente reinvestidos no propósito do negócio ou da comunidade. Com essa designação, podem ter acesso a fundos públicos, auxiliando no seu desenvolvimento.

“Aqui no Brasil não fiscalizamos a implementação das políticas públicas nem avaliamos os impactos causados por elas ”, destacou Tania.

O papel da academia no apoio aos negócios de impacto também foi tema de um dos painéis. A professora Ruth Mello, apresentou o que vem sendo feito pelo Instituto Gênesis (PUC-Rio), enquanto Clarisse Stephan falou pela Universidade Federal Fluminense.

A importância da educação empreendedora na Europa também foi citada por Tania. “A comissão Europeia criou o plano de ação para o empreendedorismo 2020. Na definição de educação empreendedora criada por eles não consta a criação de empresas. Eles acreditam que o ensino dessa matéria é necessário para a formação de um bom cidadão, trazendo benefícios sociais e econômicos”, finalizou.