Indústria de Petróleo precisa melhorar atratividade para investidores

O déficit de confiança da Petrobrás, devido aos problemas de governança e escândalos de corrupção precisa ser recuperado o quanto antes para atrair investidores, já que se trata de uma empresa de capital aberto com ações no mercado estrangeiro.

O déficit de confiança da Petrobrás, devido aos problemas de governança e escândalos de corrupção precisa ser recuperado o quanto antes para atrair investidores, já que se trata de uma empresa de capital aberto com ações no mercado estrangeiro. Já as empresas independentes atuantes no mercado de petróleo brasileiro estão com sérios problemas de financiamento, que também precisam de investimentos. Este foi o cenário apresentado no seminário 'Agenda Política Energética Brasileira para os Próximos 4 Anos'  da Associação Brasileira de Estudos em Energia, realizado nesta sexta-feira (4/12). "É o momento de discutir política energética porque o governo está preocupado, querendo recuperar a confiança dos investidores”, afirmou o professor do Grupo de Economia da Energia, Edmar Almeida.

Segundo Almeida, uma das principais causas do endividamento da Petrobras de US$ 70 bilhões nos últimos quatro anos foi a venda de seus ativos a preços abaixo do mercado. ”Desse montante de 70 bilhões de dólares, 45 bilhões deve-se aos preços abaixo do mercado. A Petrobras tem historicamente um déficit de governança por questões políticas, sabemos que o governo tem interesses que não são petroleiros na empresa”, afirmou. Segundo ele, empresas estrangeiras passaram por problemas parecidos e instituíram uma política forte de compliance, ou seja, políticas internas anticorrupção e fraude, enquanto a Petrobras não fez essa evolução. ”Agora que os escândalos apareceram vão haver sanções e multas pelos agentes reguladores do mercado de capital. Quem perdeu dinheiro e agora sabe que houve uma negociação escusa, vai querer ser compensado”, afirmou o professor, que acrescentou que a reputação é fundamental no mundo dos negócios, inclusive na indústria do petróleo, especialmente em uma empresa de capital aberto e ações no mercado internacional, como a Petrobras. “O principal problema é o efeito na confiança. Sem confiança para fazer negócio é muito difícil para a empresa se relacionar com seus parceiros e com a cadeia fornecedora. A empresa precisa melhorar rapidamente a sua política de governança e fazer uma nova política de compliance sem travar os negócios”, afirmou.

Além de melhorar a reputação da empresa para atrair investidores e fazer negócios, Edmar chama a atenção para o desafio que a Petrobras tem de gastar, segundo seu plano de negócios, US$ 220 bilhões em cinco anos, ou seja, US$44 bilhões por ano. Segundo ele, é preciso simplificar o processo operacional da negociação para que seja possível gastar esse dinheiro de forma proveitosa.“Você tem que ter poder de negociar, o que é diferente de fazer negociata, negociar com transparência, com compliance, mas tem que haver condições de negociar assim como as empresas privadas fazem, porque senão, você não consegue gastar US$ 220 bilhões em cinco anos de maneira efetiva”. 

Além da Petrobras e parceiras, a indústria de petróleo conta com cem empresas independentes no Brasil. Segundo o vice-presidente de Relações Públicas da Saitoil Brasil, Mauro Andrade, cerca de 90% da produção e investimentos no setor, são realizados pela Petrobras, mas as empresas internacionais têm um programa de investimento forte. Entre as independentes, 55 são internacionais e 45 brasileiras no upstream, parte da cadeia produtiva que antecede o refino. Segundo Almeida, as empresas brasileiras são voltadas principalmente para o mercado on-shore, ou seja, na exploração em terra. Segundo o professor, essas empresas enfrentam um desafio de financiamento.”Elas estão enfrentando problema de financiamento porque compraram áreas de exploração em um ambiente econômico em que havia oferta de crédito no mercado de equity e não estão produzindo nada. Eles estão na fase de exploração e de repente aconteceu a crise da OGX, da HRT e da Petrobras, que afetaram o mercado de equity para petróleo no Brasil, fica muito difícil conseguir financiamento”, afirmou. Ele acrescentou que a consequência é o declínio da atividade do on-shore no Brasil. “A Petrobras está focando no pré-sal e você não tem investimento suficiente no on-shore, a atividade está diminuindo”, concluiu. 

O outro desafio, segundo Edmar, é que enquanto o Brasil caminha no sentido de fechar a indústria para os investimentos privados, os outros países estão no sentido contrário, de abrir os investimentos. “Isso vai ser uma revolução para as empresas independentes americanas. Até mesmo países fechados como Bolívia e Venezuela estão se abrindo para o investimento estrangeiro. Há uma clara tendência de um maior pragmatismo na política da América Latina petroleira. A gente tem que ver essa crise como uma oportunidade para entendê-la e superá-la, mas se não a pensarmos bem, vamos sair piores dela”, afirmou.

Segundo o secretário executivo do Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP), Antônio Guimarães, os problemas econômicos poderiam ser resolvidos com a realização de rodadas regulares, inclusive no pré-sal. Para ele, a medida atrairia várias empresas para o país: “Quando temos um modelo de operador único, restringimos a atratividade de quem quer investir no pré-sal. A Petrobras, do ponto de vista tecnológico e de capacidade técnica pode agregar um valor incrível, mas se ela for exposta a um ambiente competitivo, em que ela observe que alguém está trazendo uma tecnologia, logística e abordagem diferente para desenvolver o pré-sal, todos ganharíamos”, afirmou, acrescentando que um leilão competitivo do pré-sal, onde múltiplos operadores pudessem se apresentar para competir para comprar o bloco, seria um ganho para o país. “Esse modelo que hoje impõe uma carga desproporcional à Petrobras de ser operadora única, não é o melhor para o país, nem para a Petrobras, não é o mais atrativo para melhorar o ambiente de negócios”, conclui. 

Mauro Andrade, vice-presidente de Relações Públicas da Saitoil Brasil, concorda com Guimarães. Segundo ele, a coexistência de operadores estrangeiros com a Petrobras traz competitividade para o sistema e alivia os fornecedores da cadeia e serviços que deixam de ficar dependentes de um único comprador além de gerar renda, criar valor e trocar ideias técnicas: “Não há dúvida de que com o processo de abertura ao investimento estrangeiro na área de exploração e produção no Brasil, quem mais ganhou foi a Petrobras. Ela quem mais ganhou em evolução técnica, de mercado, de know-how de operação, e certamente foi uma das empresas que mais cresceu no mundo nos últimos 15 anos. Por isso o Brasil tem que continuar sendo capaz de atrair empresas estrangeiras”, defendeu.

Segundo Antônio Guimarães, o Brasil tem um potencial enorme de qualidade de petróleo a ser explorado em comparação com países como Argentina, México e muitos outros. “Somente de 7% a 8% das bacias sedimentares brasileiras foram exploradas, isso significa que o Brasil ainda tem muito para ser descoberto, e a qualidade do que tem a ser descoberto, em termos de atratividade, é muito melhor do que a de muitos países. O país hoje tem o potencial de estar entre os dez maiores produtores de petróleo do mundo, isso significa colocar o Brasil em uma posição geopolítica completamente diferente”.

Segundo Antonio Guimarães, o país precisa materializar seu potencial melhorando o ambiente de negócios.“Eu participei dos três principais eventos internacionais para discutir petróleo este ano, o OTC, o Congresso de Energia e o Congresso Mundial de Petróleo, em nenhum lugar se falou de Brasil”, afirmou. Segundo ele, o Brasil precisa se reinserir na rota de atratividade para investimentos e destravar o desenvolvimento do setor no país. 

Para possibilitar este desenvolvimento, Antônio chama a atenção para a necessidade de estabelecer uma política de Óleo e Gás para o Brasil, que tem que ser feita para evitar uma política intermitente. Ele explica que as empresas não podem mobilizar a sua equipe de altíssimo nível sem saber se haverá demanda futura: “Não temos como desenvolver uma política de petróleo, uma política de cadeia, sem uma política de rodadas de licitações”, afirma. Ele defende uma política com rodadas anuais de licitação com uma quantidade mínima de blocos a serem explorados para atrair operadores e empresas da cadeia de fornecimento.

 

Licenciamento é gargalo

A dificuldade de fazer negócios no Brasil, segundo Guimarães, passa pelos novos requerimentos na área ambiental, que tornam o processo de licenciamento mais complexo.”Algo que poderia se licenciar com seis meses para a sísmica e no máximo um ano e meio para se fazer um poço exploratório, hoje demora dois anos e meio para fazer uma sísmica ou quatro anos para perfurar o poço. Isso muda a perspectiva da indústria. O México está dizendo que se ele não der uma licença em seis meses, a licença está automaticamente emitida. Nós do IBP somos a favor de um processo de licenciamento ambiental de altíssima qualidade, mas não existe ambiente de negócios atrativo se você tem que esperar quatro anos por um licenciamento”,afirmou.

Outra questão importante é a insegurança jurídica e tributária no país. Quando reinterpretações inesperadas de legislação geram embargos fiscais, há uma instabilidade que afeta toda a indústria, não só a do petróleo. “O governo tem mantido um processo no qual os contratos têm sido sempre preservados, o Brasil é estável do ponto de vista contratual, mas do ponto de vista legal e fiscal, há muitas mudanças que preocupam o setor. Ter um país mais seguro, sem dúvida melhora a atratividade”, destacou Guimarães.

O especialista do IBP afirmou ainda que há uma tendência de aumento da interferência do órgão regulador ou do governo nos processos empresariais. “Isso tira do empresariado o poder de tomar decisões sobre o seu investimento. Recentemente nós tivemos a discussão sobre uma nova regulamentação dos investimentos em P&D, que é aquele 1% que se gera e que se coloca em pesquisa e desenvolvimento. O operador que fazia esse investimento naquilo que ele entendia como necessário para resolver problemas futuros de tecnologia do seu negócio, a Agência Nacional do Petróleo talvez queira trazer para si essa decisão. Será que isso transforma o ambiente mais competitivo? Achamos que não”, destacou. 

 

Texto de Beatriz Perez